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[1] O peso da obesidade - uma mesa redonda multidisciplinar

A obesidade é um importante problema de saúde pública, com uma prevalência que continua a aumentar e a afetar mais de 2 mil milhões de pessoas, o que corresponde a 30% da população mundial. Portugal acompanha o paradigma mundial: segundo os dados do Inquérito Nacional de Saúde, em 2019, 53,6% da população portuguesa apresentava excesso de peso.

Mas será a obesidade uma doença ou um fator de risco? Uma pessoa pode ter excesso de peso e ser saudável? Quais serão os efeitos psicológicos? Qual é a melhor abordagem para a perda de peso?

O diagnóstico da obesidade assenta essencialmente no cálculo do IMC. Mas não será este parâmetro ligeiramente redutor? Temos de refletir se, efetivamente, não estamos a contribuir para aumentar o estigma do peso – também considerado um problema de saúde pública - e começar a resolver a discriminação da obesidade nos meios sociais, reconhecendo as suas consequências psicológicas.

Neste sentido, consideramos pertinente criar uma discussão entre três profissionais de saúde, relativamente a estas três áreas de atuação: obesidade como um problema de saúde pública, o seu tratamento individualizado e personalizado e os efeitos que tem na saúde mental a curto e a longo prazo.


[2] Da patologia ao prato - nutrição clínica

Muito provavelmente já ouviste uma variação da seguinte frase: “Não comas isso, faz mal!”. De facto, hoje, é difícil distinguir entre aquilo que é prejudicial para a saúde daquilo que faz bem, dada a multidimensionalidade nutricional dos alimentos: a fruta tem muito açúcar, mas também é uma boa fonte de fibra e vitaminas; a carne vermelha é uma boa fonte de proteína, mas está associada a um maior risco de cancro colorretal; o óleo de coco é uma melhor alternativa ao azeite por ser mais “natural,” mas tem mais gordura saturada. 

Estes constituem apenas uma fração do excesso de informação que é muitas vezes responsável por uma confusão generalizada, cujo principal resultado é a demonização dos alimentos, pouco fundamentada e com grande impacto na nossa relação com a comida. 

De facto, a consciência daquilo que consumimos no quotidiano é importante para a manutenção da saúde. Porém, é necessário alertar contra a restrição que pode advir desta, podendo, por sua vez, constituir a raiz de diversos distúrbios do comportamento alimentar. 

Atualmente, a incidência destes transtornos mentais está num trajeto crescente, especialmente devido à pedestalização e idealização de um estilo de vida “saudável” e à estigmatização do excesso de peso numa sociedade cada vez mais focada no físico. 

Desta forma, consideramos essencial, não só desmistificar alguns destes conceitos, abordando como a prática contínua de certos hábitos alimentares poderá estar na base de algumas patologias, mas também acautelar contra a sua propagação na comunidade e potencial impacto a nível da saúde física e mental.


[3] (In)Gestão nutricional - política e gestão alimentar

O Programa Nacional de Promoção da Alimentação Saudável (PNPAS) é um dos programas prioritários do Plano Nacional de Saúde, cujo objetivo é reforçar a importância das políticas alimentares e nutricionais. 

O PNPAS declarou como metas para 2020 controlar a prevalência de excesso de peso e obesidade na população infantil e escolar, reduzir a quantidade média de sal e açúcar presente nos principais alimentos, reduzir a quantidade de ácidos gordos trans no total das gorduras disponibilizadas, promover o aumento do consumo de fruta e ainda dar a conhecer, ao maior número de pessoas, os princípios da dieta mediterrânea.

Para que o país consiga alcançar estes objetivos, é necessária uma cooperação política superior e uniformizada, entre o governo e os agentes do setor privado, de maneira a criar uma mudança com o maior impacto possível. Como exemplo, em 2017, foi implementado o imposto especial sobre bebidas açucaradas, com o objetivo de reduzir a quantidade média de açúcar nestes alimentos. De facto, esta medida teve prospeções bastante positivas, onde ocorreu, efetivamente, uma diminuição de aproximadamente 0,7g de açúcar por 100g de bebida.

Para além da taxação de bebidas açucaradas, existem outras leis que contribuem para alcançar as metas estabelecidas pelo PNPAS: em 2019, foram induzidas restrições à publicidade dirigida a menores de 16 anos de produtos alimentares e bebidas que contivessem elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos trans.

As questões sobre as quais desafiamos a refletir são quais serão as dificuldades para a criação de políticas nutricionais? Qual o seu acolhimento pela sociedade portuguesa? Serão estas iniciativas uma prioridade para o governo português? Qual será o próximo passo? 


[4] Nutrir o agora - nutrição na atualidade

No contexto das circunstâncias extraordinárias criadas pela pandemia de COVID-19, verificou-se que até um décimo da população mundial sofria de malnutrição em 2020. Considerando os avanços a nível da industrialização alimentar e da produção em massa de alimentos, este facto torna-se ainda mais assustador, sendo elucidativo da disparidade no acesso aos alimentos, predominantemente verificada nos países em desenvolvimento. 

Pelo contrário, evidencia-se uma maior disponibilidade de aporte nutricional nos países desenvolvidos que, paradoxalmente, não se traduz necessariamente numa nutrição mais adequada, nem no seu acesso equitativo ao nível dos diferentes estratos socioeconómicos. Para esta iniquidade de acesso aos alimentos contribui também o desperdício alimentar, com efeitos significativos na progressão das alterações climáticas.

Assim sendo, é pertinente abordar o papel do nutricionista no enfrentamento destes desafios, cujas repercussões não se limitam à saúde global, mas também ao ambiente. Para além de intervenções ao nível da política alimentar, uma ferramenta útil, embora contraditória, que o mesmo tem ao seu dispor é a tecnologia. Hoje, a influência desta no âmbito dos comportamentos alimentares e nos níveis de atividade física é inquestionável. Ao disponibilizar inúmeros métodos de quantificação do aporte nutricional e energético, para além do exercício físico, permite uma melhor gestão destes e uma maior autoconscientização dos hábitos e do seu impacto, não só na saúde mas também no ambiente, por exemplo através do cálculo da pegada de carbono. Assim, apesar desta se associar frequentemente ao sedentarismo, a sua mobilização pelo nutricionista como arma no combate da malnutrição e obesidade é vital, permitindo o alcance de hábitos promotores de saúde sustentáveis. 


Autoria: Comissão Organizadora do Nutri2Go

Edição de Imagem: Catarina Simões e Felipe Bezerra

Referências Bibliográficas:

[1] Caballero, B. (2019). Humans against Obesity: Who Will Win? Advances in Nutrition, 10(suppl_1), S4–S9. https://doi.org/10.1093/advances/nmy055

[1] Pont, S. J., Puhl, R., Cook, S. R., & Slusser, W. (2017). Stigma Experienced by Children and Adolescents With Obesity. Pediatrics, 140(6), e20173034. https://doi.org/10.1542/peds.2017-3034 

[1, 3] Direção Geral de Saúde. (2020, October). PROGRAMA NACIONAL PARA a PROMOÇÃO DA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL 2020. Maria João Gregório, Sofia Mendes de Sousa, Diana Teixeira. https://alimentacaosaudavel.dgs.pt/activeapp2020/wp-content/uploads/2020/11/Relato%CC%81rio-PNPAS-2020.pdf 

[4] UN report: Pandemic year marked by spike in world hunger. (2021, July 12). World Health Organization. https://www.who.int/news/item/12-07-2021-un-report-pandemic-year-marked-by-spike-in-world-hunger